Dr. Carlos Mosconi, criador do SUS e uma das principais figuras da política do Brasil fala ao Mantiqueira
Poços de Caldas, MG – Na edição impressa do jornal Mantiqueira, deste sábado, estamos trazendo uma matéria especial com o Dr. Carlos Eduardo Venturelli Mosconi. Quatro vezes eleito deputado federal por Minas Gerais, Mosconi é um dos políticos mais importantes do Brasil. Nascido em São Paulo, mudou-se para Poços de Caldas em 1975. Formado em Medicina pela Universidade de Brasília, fez residência médica por três anos em nefrologia e urologia, na Universidade de São Paulo (USP). Trabalhou como professor nas Faculdades de Medicina de Itajubá e de Alfenas, e também foi diretor da Faculdade de Medicina-Unifenas-BH. Em 1982 começou sua carreira política onde se destacou com várias ações de destaque, tendo sido eleito deputado federal por duas vezes e ainda tendo com destaque ter sido o criador do Sistema Único de Saúde, o SUS através da Emenda 29.
“Minha vida foi interessante porque me formei em medicina em Brasília, depois fiz uma bela residência em São Paulo, então tive um bom preparo para ser um bom médico”, destacou Mosconi. Depois de um período na capital paulista, Mosconi veio para Poços de Caldas, e até hoje destaca que foi uma das escolhas mais corretas de sua vida. “Uma cidade tão boa para viver, tão favorável, com aspectos tão positivos. Digo que tanto para mim como para minha esposa Maria Lúcia e meus filhos termos escolhido Poços de Caldas, foi a melhor opção”, destacou.
História
Sua carreira política começou em 1982, como deputado federal. Já no primeiro mandato, foi presidente da Comissão de Saúde da Câmara Federal. Mesmo sendo deputado por Minas Gerais, foi chamado pelo governador José Aparecido para ser Secretário Estadual de Saúde do Distrito Federal (1985), tendo sido apoiado pelas lideranças de sua base política em Minas. Foi Secretário de Assuntos Municipais no governo Eduardo Azeredo e presidente da Fundação Hospitalar no governo Aécio Neves.
Em sua carreira partidária, foi um dos fundadores do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e primeiro presidente da legenda em Minas, de 1988 a 1991, retornando ao posto em 1998 até 2000. Também foi vice-presidente, de 2007 a 2009. Em 2010, Mosconi foi tesoureiro da campanha eleitoral do partido em Minas. Desde 2011, exerce a função de secretário-geral da legenda mineira. Também é um dos membros do diretório nacional do partido por indicação de Aécio Neves. “Sempre fui um deputado com vocação regional e me orgulho disto. Foi presidente do PSDB regional duas vezes e vice-presidente do PSDB nacional, mas sempre baseei minha atuação política na nossa região. Nunca tive pretensão nem ambição de querer sair por aí e não me arrependo”, disse Mosconi. Ele classifica sua carreira política como modesta, mas se orgulha em dizer que foi uma carreira de muito trabalho e repleta de ideais onde priorizou o Brasil e seu povo. “A vida política não é fácil, sacrificante, cheia de incompreensões, muitos problemas, mas tudo tem que ser superado”, completou.
A carreira
Mosconi destacou que em Poços de Caldas foi o lugar perfeito para o início da carreira como médico. Ele conta que chegou na estância numa fase muito promissora da carreira e além da medicina havia acabado de ser convidado para ser professor de medicina em Itajubá. Foi uma época em que ele pegava estrada uma vez por semana para lecionar naquela cidade.
Política no sangue
Conseguindo conciliar bem as idas e vindas entre Itajubá e Poços de Caldas, Mosconi levava uma vida bem tranquila, mas a política estava no sangue. Tudo começou de uma amizade entre as famílias de Mosconi e o saudoso ex-presidente do Brasil Tancredo Neves. “Esta amizade era tão grande que fui convidado a morar na casa dele no período que fazia o curso de medicina, então isso estreitou ainda mais os laços e me apresentou aquele mundo da política!”, conta Mosconi. Aquele convívio aumentou o gosto pela política já que a vida agitada de Tancredo Neves era rotina para o futuro médico Mosconi. Para o Dr. Mosconi, Tancredo Neves é um dos maiores políticos da história,. “Um fenômeno, um talento extraordinário para a política”, destacou Mosconi.
MDB
Mosconi logo começou a militar na política pelo partido MDB e a relação com Tancredo Neves, que era deputado federal na época, só aumentava. As vindas de Tancredo a Poços e Mosconi a Brasília eram constantes. Foi aí que começaram a surgir as primeiras conversas para que Mosconi fosse candidato a deputado federal. O ano era 1982. Aquela altura Mosconi já tinha um grande ciclo de amizade, tanto em Poços de Caldas quanto na região. Seu nome vinha se tornando uma referência em toda a região. “Neste ponto preciso ressaltar a posição de meu pai, nesta época ele já era falecido, morreu muito cedo, com 51 anos em 1970, mas seu nome ainda tinha muito prestígio, principalmente na região de Andradas e na região de Pouso Alegre”, destaca Mosconi. Foi uma das facilidades que Mosconi teve para ganhar a simpatia da região e entrar para uma disputa eleitoral difícil com grandes chances de vitória.
Deputado
E foi exatamente isto que aconteceu. Em sua primeira disputa para uma Câmara no Congresso Federal, Carlos Mosconi foi eleito. “Fui para Brasília cheio de esperança e muitos sonhos”, falou. Mosconi destaca que aquela campanha em 1982 foi a melhor que participou em toda sua vida política. No mesmo pleito Tancredo Neves se elegeu governador de Minas Gerais. “A bandeira da nossa eleição era grandiosa, uma bandeira idealista com o objetivo de voltar o Brasil para a democracia. A eleição do Tancredo, do Franco Montoro e outros governadores era o passo que estava sendo dado na volta do Brasil para a democracia. E foi o que aconteceu. Mais tarde Tancredo foi eleito presidente do Brasil pelo povo, mas infelizmente não tomou posse em razão da doença que acabou ceifando a vida dessa grande liderança do Brasil”, destacou Mosconi.
Relator da Saúde
Convidado pelo senador Mário Covas, líder do MDB, Mosconi, que tinha se tornado constituinte, se tornou relator da saúde. Teve ali talvez a passagem mais importante de sua carreira política. Mosconi lembra que era uma época no Brasil em que a saúde praticamente não existia no Brasil como uma instituição organizacional para atender a população brasileira. Não havia uma organização administrativa, não havia recursos financeiros e o que se via era só precariedade. Era uma época que o brasileiro recorria a postos de saúde, um aqui ou ali, e era atendido de qualquer jeito. Era uma época sombria e a população sem dinheiro era tratada como indigente. “O pior disto tudo é que não tinha onde reclamar, não havia uma lei para facilitar a vida desse contingente da população por isto ser relator da Saúde naquele momento foi uma coisa fantástica. Como médico eu tinha plena consciência destas questões e estes problemas tinham que ser resolvidos”, lembrou Mosconi. E isto acabou se tornando prioridade na Constituição. Foi uma época onde aconteceram centenas de audiências públicas em todo o Brasil e envolvendo todos os seguimentos de saúde no Brasil.
Nascimento do SUS
O Sistema Único de Saúde, o SUS, começou a nascer neste período e teve em Mosconi peça fundamental para sua implantação no Brasil. “Foi uma coisa fantástica e no começo ninguém acreditava que ia dar certo, que ia ser aprovado. “Isto não é possível, isto não vai pra frente, um projeto socializante, estatizante. Ouvimos dai para pior, mas não era nada disto”, destaca Mosconi. Ele conta que foi sendo feito um grande trabalho político de convencimento das pessoas de que o Brasil precisa do Sistema Único de Saúde, precisava do SUS. A população era absolutamente carente deste sistema e aos poucos fomos conseguindo convencer a grande maioria”, destacou Mosconi. E o trabalho foi dando certo, a Constituinte começou a aceitar a situação e o SUS foi sendo criado. “A saúde é um direito de todos e é um dever do Estado”. Mosconi lembra que esta frase ajudou a mudar o panorama da saúde no Brasil. “Uma frase que evidenciou que a saúde naquele momento passou a ser direito de todos. O SUS mudou tudo na vida do brasileiro, passou a dar tratamento digno a todas as pessoas”, destacou. A aprovação do SUS na Constituição é um dos fatos mais importantes da história, uma aprovação na época por unanimidade. Nos primeiros dias de aprovação ficou uma dúvida. Como financiar aquele projeto audacioso? Onde busca recursos? Os economistas da Constituição acharam muitos problemas e a definição deste financiamento ficou para depois, isto gerou muitas dificuldades na implantação do SUS já que a dúvida de quem iria pagar a conta era grande. Mosconi destaca que outro ex-presidente saudoso teve papel importante neste processo. Ele assumiu o lugar de Fernando Collor de Mello, que havia sofrido Impeachment. Na época, Mosconi era presidente do Inamps que foi extinto por Itamar Franco. “Apesar de muito poderoso o Inamps tinha um plano de saúde incompleto e sua extinção acabou facilitando a criação do SUS. Mostrei para o Itamar as vantagens do SUS em relação ao Inamps um novo sistema que dava acesso à saúde para todos, indiscriminadamente, o que não acontecia com o Inamps. Mostrei para o Itamar que o Brasil não praticava saúde e tudo precisava mudar”, falou Mosconi. Ele lembra que Itamar ficou surpreso com o cenário que tinha acabado de conhecer e tempos depois acabou com o Inamps. “Foi um ato corajoso, mas isto era a característica do Itamar Franco. Ele era um homem corajoso e enfrentava as adversidades naturamente”, destacou Mosconi. Com o fim do Inamps o SUS se fortaleceu e começou de fato a nascer e se tornou referência de saúde em todo o mundo. Para resolver a questão do financiamento, Mosconi apresentou a emenda Pec 29 e isto resolveu definitivamente a situação. O custo seria bancado pelos governos federal (8%), estadual (12%) e municipal (15%). Apesar de uma grande demora, o Congresso acabou aprovando a emenda, mas isto levou dez anos. Apenas em 2011 a questão foi resolvida. Mas a presidente da época, Dilma Rousseff, vetou os 8% do governo federal e assim prevaleceram 12% dos Estados e 15% dos municípios. “Isto ainda apresenta problemas até hoje, já que o SUS ficou subfinanciado”, destacou Mosconi. “Mesmo com tantas adversidades o SUS tá aí. Se não fosse ele, como a gente ia passar por esta pandemia. O SUS foi fundamental”, completou Mosconi.
Plano Real
Dr. Mosconi participou ativamente das conversas para o lançamento do Plano Real, criado no governo Itamar Franco. Mosconi classifica este fato como uma das coisas mais importantes que aconteceram no Brasil em sua história moderna. Ele recorda que o Brasil vivia uma inflação gigantesca e o salário recebido pelo trabalhador hoje, não valia quase nada amanhã. “Era terrível, uma coisa cruel com a população”, falou Mosconi. Ele recorda que o presidente Itamar Franco e o então senador Fernando Henrique Cardoso, Ministro das Finanças criaram o Plano Real. “Participei de muitas conversas no Congresso Nacional para saber detalhes deste plano que teve seu lançamento em Poços de Caldas”, destacou. Mosconi conta detalhes da troca da primeira moeda do Plano Real que aconteceu no Banco do Brasil de Poços de Caldas pelo então ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso. “Quem trocou esta nota foi nosso saudoso amigo Evandro Torres, nosso amigo, funcionário do Banco do Brasil e por coincidência filiado do PSDB”, lembra Mosconi. “O Plano Real de certa maneira nasceu aqui e a gente não pode deixar isto apagado e esquecido”.
Futuro
O futuro é todo para a família. Desde que saiu da secretaria de Saúde de Poços de Caldas ele deixou claro que não seria candidato a mais nada. “Gostei de ser secretário da Saúde em Poços de Caldas, foi um trabalho interessante, vivi uma outra realidade. Ver as necessidades do município, o sistema de saúde, a sua estrutura para poder atender a população. “Muitas vezes não conseguimos fazer aquilo que queremos, já que isto depende de uma série de fatores, enfim, muitas questões em jogo, mas me senti feliz com o trabalho realizado”, falou Mosconi. Ele lembrou que na pandemia Poços de Caldas foi exemplo, um sistema de vacinação invejável e tudo funcionou muito bem. “Todos trabalharam demais, chegamos a ter 100 pacientes internados em leito de UTI-Covid na cidade e a gente conseguiu atender a todos. Nenhum paciente precisou sair de Poços de Caldas para ser atendido. A região também mandou seus pacientes para cá e todos foram muito bem atendidos”, destacou. “Conseguimos sobreviver nesta situação muito triste, perdemos muitas pessoas, vimos de perto o sofrimento dos familiares, enfim, a pandemia vai deixar esta marca na história e lamento muito tudo isso. Foi uma tragédia, uma das maiores da humanidade, mas pelo menos conseguimos em Poços de Caldas atender a todos”, destacou. “Agradeço muito as pessoas com quem trabalhei, governadores, presidentes, o prefeito Sérgio Azevedo, que foi muito solicito e sensível nestas questões de saúde que vivemos em Poços de Caldas. Faltavam recursos e eu tinha receio de uma situação pior que felizmente não aconteceu. O prefeito teve a sensibilidade de entender a gravidade da situação e ter nos dado este apoio. Não posso deixar de agradecer minha esposa Maria Lúcia que me acompanhou a vida inteira, sei que não é fácil pois fiquei fora de casa a vida inteira, meus filhos muitas vezes foram criados sem a presença do pai, como é importante, todos compreenderam, enfim, a vida tem sido esta e agora o futuro espero que seja mais tranquilo, claro que ainda espero seguir sendo útil para as pessoas e solidário para meus semelhantes”, completou.
Política atual
Sobre a política atual, Mosconi não está muito satisfeito com os rumos que o Brasil vem tomando. Ele destaca que os tempos são de uma política desvirtuada. “No período da constituinte não havia corrupção e nos tempos atuais é uma constante, uma coisa que agride o país, o povo brasileiro. A gente não sabe mais se pode acreditar na justiça e o saldo disto tudo é um radicalismo sem sentido, que não leva a lugar nenhum. O povo precisa de trabalho, moradia, boas condições de vida, escola, saúde. Minha vontade é ver o trabalho sendo feito para suprir as necessidades da população brasileira. Ainda estamos muito longe disto”, lamentou. Para Mosconi estamos vivendo uma fase precária da política brasileira e que ficará marcada negativamente para sempre. “O Brasil é fabuloso, rico em vários setores e tem um povo maravilhoso que merece um país melhor”, completou.
Nilton Gomes Junqueira
Presidente do PSDB
José Antônio Porto
Vice-presidente do PSDB/Poços de Caldas