A língua portuguesa e os neologismos
Hugo Pontes
Professor, poeta
e jornalista
Define-se neologismo como toda palavra ou expressão criada de maneira espontânea ou forçada. Também se considera neologismo um novo significado atribuído a uma palavra já existente no vocabulário. Como exemplo a palavra “Legal” que significa dentro da lei; e pode ser entendido, também, com o sentido de algo bom.
O neologismo pode ser criado no próprio idioma ou importado de uma língua estrangeira, como ocorre frequentemente na linguagem técnica. Há aqueles de caráter popular ou literário, restritos a um determinado idioma, e outros, como os termos científicos, que são internacionais, e devem ser adaptados morfologicamente a cada idioma.
Os neologismos podem ser léxicos e sintáticos. Os primeiros, quando corretamente adaptados à língua, enriquecem o vocabulário sem ferir o gênio da língua; os sintáticos, também chamados de construção, empobrecem o idioma por atentarem contra a sua estrutura e recomenda-se que sejam evitados.
As nomenclaturas científicas e técnica são quase todas baseadas nas línguas grega e latina. Dessa forma os neologismos criados em inglês utilizam, em sua maioria, radicais gregos e latinos, o que facilita a sua adaptação às línguas neolatinas como o Português.
Há neologismos que são formados com as letras iniciais da expressão designativa de uma doença, como AIDS (Acquired Immune Deficiency Syndrome), É discutível, nesses casos, se as letras devem estar dispostas na sequência das palavras do idioma de origem ou de sua tradução vernácula, como é o caso de SIDA, em Portugal, pois a tradução é Síndrome da Imuno Deficiência Adquirida.
Por outro lado, a aceitação de um vocábulo importado só se justifica quando absolutamente necessário por não existir palavra vernácula equivalente e, nesse caso, é imprescindível sua correta adaptação morfológica; do contrário, é preferível usar-se a palavra no idioma de origem, por empréstimo, destacando-a em negrito ou itálico para mostrar que aquela é uma palavra originária de outro idioma. Exemplo disso é a palavra cassino, originária do Latim (casino), passando para o italiano, francês e chegando até nós escrita com dois SS. Isso porque a pronúncia no idioma português tem som forte CaSSino, caso contrário deverá ser pronunciado CaZino.
O registro de um neologismo nos dicionários assegura a sua incorporação definitiva ao léxico e nos dá a tranquilidade necessária para o seu uso. Exemplo disso é a palavra solucionática, criada pelo jogador Dario, do Atlético Mineiro, quando proferiu a frase: “Não me venham com a problemática, que eu tenho a solucionática.” Ou o ex-ministro do trabalho, Rogério Magri, que criou a palavra imexível.
O neologismo sintático importado do inglês constitui uma aberração que descaracteriza o nosso idioma e decorre, quase sempre, de traduções literais e despreparo dos tradutores. O hábito da leitura de textos médicos em inglês também contribui, subconscientemente, para a aceitação e utilização de expressões e construções sintáticas próprias da língua inglesa, travestidas em roupagem vernácula. Caracterizando o denominado gerundismo (palavra que é um neologismo). Como exemplo, podemos citar a tradução “tem sido mostrado” (má tradução do inglês para “it has been shown”) que pode ser dito: foi mostrado, ou mostrou-se.
É sabido que a língua é dinâmica e se renova constantemente. Muitas palavras tornam-se arcaicas e deixam de ser usadas; outras mudam de significado ou adquirem novas acepções. A criação de neologismos é um dos instrumentos de renovação da língua. Apesar da renovação constante em seu léxico, a língua tem sua estrutura própria, sua gramática, sua maneira de expressar-se, seu paradigma culto, que devem ser respeitados e conservados. Colecionamos alguns absurdos cometidos contra o idioma português com a aparição de neologismos ditos, em geral, por pessoas ditas cultas: competitivados (competitivos), inicializar (iniciar), principializar (principiar), Cartório Registral (no lugar da locução adjetiva Cartório de Registro), repetimização (repetir, ou repetição), desaposentação (essa não tem como explicar, pois não dá para saber se alguém que aposenta se arrepende e volta ao trabalho), modernialização (modernização), descontinualizar (talvez queiram dizer interromper), garantista (garantia??) e extraordinariedades (para coisas extraordinárias).
E assim o idioma é castigado, quer pelas traduções duvidosas ou pelo mau uso do idioma.