Entrevista com José Carlos Quiciri: o legado e a paixão pelo gol
Poços de Caldas, MG – Na edição de hoje do Mantiqueira, conversamos com José Carlos Quiciri, preparador de goleiros com uma trajetória marcante em clubes como Caldense e Poços de Caldas Futebol Clube, além de seu trabalho de destaque na Escola de Futebol Zico 10/Coopoços. Quiciri, conhecido por revelar e moldar talentos, compartilha sua jornada e paixão pelo futebol.
O Início de
uma Trajetória
José Carlos Quiciri revelou como a sua paixão pelo futebol e, em particular, pela posição de goleiro, começou na infância. “A influência do meu pai foi fundamental para mim”, disse ele. Seu pai, apesar de limitações físicas, era um entusiasta do futebol e jogava como goleiro no futebol de várzea. “Desde pequeno, eu o acompanhava nos jogos e sempre estive envolvido com o futebol”, relembra Quiciri. Ele menciona que sua paixão pela posição de goleiro foi evidente desde cedo. “Minha mãe e meu pai sempre dizem que comecei a chutar qualquer coisa que eu encontrasse, desde que comecei a andar”, conta. Para Quiciri, o desejo de ser goleiro era natural e intrínseco, algo que nunca mudou ao longo dos anos. Ao refletir sobre sua trajetória, Quiciri destaca o impacto profundo da vivência ao lado de seu pai e no ambiente do futebol amador. “Essa influência moldou não só minha paixão pelo futebol, mas também minha determinação em seguir a carreira como goleiro”, afirma.
Dificuldades
Na vida, nem tudo são flores. Para muitos, isso se torna uma dura realidade desde muito cedo. Aos cinco anos, um diagnóstico de câncer alterou completamente o curso da vida de Quiciri. A jornada difícil começou com uma cirurgia, e, com apenas sete anos, ele já havia enfrentado a terceira operação. O tratamento exigiu um regime intenso e agressivo de quimioterapia e radioterapia.
Essas terapias, necessárias para combater o câncer, também tiveram um impacto significativo em sua vida cotidiana. Por conta dos efeitos colaterais e do próprio tratamento, Quiciri se viu afastado do esporte, uma paixão que antes preenchia seus dias. O esporte, um elemento crucial para sua identidade e bem-estar, teve que ser deixado de lado devido às demandas e limitações impostas pelo tratamento.
A realidade do tratamento do câncer é que ele pode ser extremamente desgastante, tanto física quanto emocionalmente. Para uma criança, isso representa uma interrupção abrupta na vida e nas atividades que costumavam trazer alegria e sentido. No caso de José Carlos Quiciri, a necessidade de se afastar do esporte não foi uma escolha, mas uma consequência das dificuldades impostas pelo tratamento.
Desafios
No entanto, a história de Quiciri não é apenas sobre os desafios que enfrentou, mas também sobre a força e a resiliência que demonstrou durante esses anos difíceis. Sua experiência ilustra a coragem necessária para enfrentar uma doença tão severa desde uma idade tão jovem e o impacto profundo que isso pode ter na vida de uma pessoa.
A determinação e o espírito de superação são evidentes na forma como ele navegou por esse período turbulento, lidando com as adversidades e mantendo a esperança.
Quiciri expressou sua gratidão e fé em Deus, afirmando que “graças a Deus, Deus é bom na vida da gente”. Ele enfatizou que acredita que Deus tem um propósito em todas as coisas que a cura que recebeu foi uma ação divina. Quiciri detalhou que seu tratamento foi longo e complexo, envolvendo um acompanhamento contínuo.
Para ilustrar a intensidade e a duração do tratamento, ele mencionou que, mesmo após sua carreira como atleta profissional, continuou a receber acompanhamento médico no mesmo hospital onde iniciou seu tratamento: o Hospital A.C. Camargo, em São Paulo. O Hospital A.C. Camargo é uma instituição renomada no tratamento de câncer no Brasil e foi também o local onde o cantor Leandro, da famosa dupla Leandro e Leonardo, recebeu tratamento antes de seu falecimento. Quiciri fez seu acompanhamento na A.C. Camargo até os 19 anos, quando recebeu alta e concluiu seu longo percurso de tratamento.
Proibição materna
Após superar a fase mais crítica do tratamento contra o câncer, a alegria de retomar atividades normais trouxe um alívio significativo. Para um jovem jogador de futebol, essa alegria se misturou com uma preocupação constante: o receio de sua mãe em relação ao retorno às atividades esportivas, especialmente à posição de goleiro. Recuperado da fase aguda da doença, Quiciri estava ansioso para voltar ao campo. No entanto, sua mãe, ainda assombrada pelas lembranças dolorosas do tratamento e temerosa de um novo impacto que pudesse reacender a doença, decidiu que ele não jogaria mais na posição de goleiro. A decisão dela foi baseada na experiência traumática do passado, e o medo de que uma nova pancada pudesse trazer de volta o sofrimento do câncer era uma constante.
O episódio mais marcante ocorreu durante uma atividade recreativa na escola, onde a equipe de futebol infantil treinava diariamente. Em um dos treinos, Quiciri decidiu assumir a posição de goleiro, apenas para ser imediatamente retirado pelo professor.
O motivo? A proibição materna, que havia sido comunicada ao staff da escola. O professor, seguindo as diretrizes estabelecidas pela mãe do jovem, explicou que a posição de goleiro estava fora dos limites para ele, devido ao medo de um possível impacto que poderia prejudicar sua recuperação. “Eu saí chorando do gol, eu lembro”, disse ele, destacando a profunda frustração e desânimo que sentiu naquele dia. Apesar da dor, o jovem atleta fez uma promessa a si: “Na minha cabeça, eu pensei comigo, eu falei assim: ninguém nunca mais vai fazer isso.” Esse momento de choro e desilusão se transformou em combustível para sua determinação. Quiciri revelou como essa experiência o impulsionou: “Eu vou virar um jogador profissional. Eu saí do gol chorando naquele dia, mas eu falei, ninguém nunca mais vai me tirar do gol.” “Mesmo contra a minha mãe…”.
Virada
A virada na vida de Quiciri aconteceu quando foi criada a escolinha de futebol “Gol de Placa”, no bairro São José. A oportunidade de treinar em uma estrutura organizada marcou o início de sua carreira promissora. Seu talento logo chamou a atenção do professor Marcelo Albino, conhecido como Marcelinho, que foi à casa de Quiciri para convencer sua mãe a autorizá-lo a continuar no futebol. Com a autorização de sua mãe, Quiciri começou a treinar no Gol de Placa e, posteriormente, passou a integrar a equipe da Alcoa, sob a orientação do professor Erik. Em 2005, sua trajetória sofreu um novo impulso quando a Caldense lançou um programa de base. No final daquele ano, o professor Zezito começou a integrar os jovens jogadores aos treinos da equipe profissional, e em meados de 2006, Quiciri foi promovido ao time principal, embora não tenha chegado a assinar contrato formal. A busca por novas oportunidades levou Quiciri a São Paulo no final de 2006, onde jogou em um time de empresário. Em seguida, passou pelo Nacional e, posteriormente, pelo XV de Indaial, onde assinou seu primeiro contrato profissional. Sua carreira continuou com uma passagem pelo Vila Nova na Taça BH e pelo Maringá, onde disputou o Campeonato Paranaense da Segunda Divisão. Quiciri decidiu encerrar sua carreira como jogador em 2012, no Vulcão. No entanto, sua paixão pelo futebol não terminou.
Oportunidades
José Carlos Quiciri detalhou como a Escola de Futebol Futpoços, sob a orientação de Tata, desempenhou um papel crucial em sua formação e desenvolvimento. “Foi a oportunidade que Deus preparou na minha vida através do Tata”, afirmou Quiciri. Ele começou a trabalhar na Futpoços no final de 2012, dando seus primeiros passos como treinador de goleiros. “Sou muito grato ao Tata e ao pessoal da Futpoços, porque foi ali que comecei a me destacar”, acrescentou.
Faculdade
Com 24 anos, Quiciri decidiu ingressar na faculdade e começou paralelamente a se dedicar ao treinamento de goleiros. Seu trabalho chamou a atenção do Wellington Paulista, na época da Escolinha de Futebol Coopoços, que o convidou para se juntar à equipe. “Vi que era um projeto muito grande, com mais visibilidade e oportunidades”, lembrou. A passagem pela Coopoços é um marco significativo na carreira de Quiciri. “Foi quando eu vesti realmente a camiseta, terminei a faculdade e comecei a vislumbrar uma carreira profissional como treinador de goleiros”, disse. Durante esse período, ele concluiu a pós-graduação e realizou cursos de extensão na CBF, especializando-se na preparação de goleiros profissionalmente. Em 2018, Quiciri teve a chance de estagiar e atuar como auxiliar no profissional da Caldense, uma experiência que lhe proporcionou uma visão mais aprofundada do futebol profissional. “Foi uma oportunidade valiosa para conhecer o processo do futebol profissional”, afirmou. Em 2019, Quiciri recebeu um convite para se tornar treinador de goleiros principal em uma equipe profissional em Poços de Caldas. “Essa foi a chance de verdade para começar a desenvolver minha carreira”, destacou.
Licença
José Carlos Quiciri agora entra em nova fase. Ele acaba de obter a Licença A da CBF, a mais alta qualificação para treinadores de goleiros no Brasil. Quiciri destacou a importância deste avanço em sua trajetória profissional e sua gratidão pelas oportunidades que teve no futebol.
Quiciri explicou que, após acumular uma vasta experiência no campo, decidiu que era o momento de buscar um novo desafio. “Dando sequência nesse processo, achei que era o momento de dar um passo maior”, afirmou. Ele preparou toda a documentação necessária e enviou para a CBF Academy, pleiteando a Licença A, o grau máximo de qualificação para treinadores de goleiros.
Ele ressaltou que, com a obtenção desta licença, está apto a trabalhar em competições de alto nível, como o Campeonato Brasileiro e a Copa Libertadores, além de ter a possibilidade de atuar no cenário internacional. “É só buscar aprovar a documentação para fora do Brasil”, explicou Quiciri, demonstrando confiança na continuidade de sua carreira.
Caldense
Neste ano, Quiciri teve a oportunidade de ser o treinador da Caldense no Campeonato Mineiro, onde desempenhou um papel significativo no desempenho da equipe. Seu goleiro teve atuações destacadas, sendo selecionado para a seleção da rodada em duas ocasiões e ajudando a equipe a manter a defesa sólida em várias partidas. “Ficamos algumas partidas sem sofrer gol, o que demonstra não só o trabalho do goleiro, mas de toda a equipe”, ressaltou.
Quiciri expressou sua satisfação em ter colaborado com profissionais da cidade e destacou a importância de valorizar talentos locais. “Fiquei muito feliz em ter trabalhado com o professor Mauro Fernandes, o professor Luiz e toda a comissão técnica da Caldense. Isso mostra que o futebol de nossa cidade tem grandes profissionais e que podemos ser reconhecidos e valorizados aqui, sem precisar buscar reconhecimento fora”, afirmou. Sou muito grato a Deus por conquistar toda essa trajetória”.