Foto: Divulgação Jornal do Sudoeste –

Estudante enfrenta sala vazia e conquista internet com rotina universitária

Data da Publicação:

05/02/2025

São Sebastião do Paraíso, MG – Ser a única aluna de uma turma universitária pode parecer um cenário improvável, mas para a jovem Isadora Bernardo Rezende (foto), de 21 anos, essa é a realidade diária desde que iniciou seus estudos no novo campus da Universidade Federal de Lavras (UFLA) em São Sebastião do Paraíso. Natural da própria cidade, ela viralizou na inter-net ao compartilhar sua rotina solitária de Engenharia de Produção – e, ao mesmo tempo, repleta de descobertas e oportunidades únicas.

Com um sorriso fácil e a desenvoltura típica de quem já fez teatro por cinco anos na Oficina de Artes Cênicas Sebastião Furlan, Isadora explica que sua habilidade de comunicação a ajuda a criar conteúdo para a internet. No vídeo que se espalhou pelas redes, ela aparece sozinha na sala de aula, contando curiosidades sobre seu dia a dia acadêmico. “Nunca imaginei que minha história fosse chamar tanta atenção”, comenta. “Eu só queria mostrar como é o curso, o campus e, principalmente, incentivar mais pessoas a virem estudar aqui.”

A trajetória de Isadora na Engenharia de Produção começou quase por acaso. Ela confessa que, durante boa parte da juventude, sonhava em seguir carreira em Artes Cênicas, não em Exatas. “Eu nunca quis fazer Engenharia. Nunca passou pela minha cabeça”, conta. A virada aconteceu em dezembro de 2021, quando participou da Feira de Ciência e Tecnologia da prefeitura de Paraíso. Na ocasião, havia um estande da UFLA que apresentava os cursos e anunciava a inauguração do novo campus para março de 2022.

A jovem, que havia prestado o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), decidiu conversar com um representante da universidade sobre as possibilidades de formação. “Eles me explicaram que teríamos três Engenharias: de Software, Elétrica e de Produção. Fui me interessando mais pela de Produção, sobretudo porque meus pais são empreendedores. Conforme ouvi mais detalhes, percebi que fazia sentido para mim.”

A família a encorajou a embarcar nessa jornada. “Minha mãe disse que acreditava no meu potencial. Então me inscrevi, passei e comecei as aulas em 10 de março de 2022. Logo no primeiro dia, nós, 12 alunos, nos apresentamos e cada um revelou qual engenharia pretendia cursar. Só eu escolhi Produção; a maior parte optou por Engenharia de Software.”

UM CURSO EM  DOIS CICLOS

O Bacharelado Interdisci-plinar em Inovação, Ciência e Tecnologia funciona em dois ciclos, e é isso que torna a experiência de Isadora ainda mais singular. Inicialmente, todos entram no Bacharelado e cursam matérias básicas como Cálculo, Física e Química. Depois de três anos, partem para a Engenharia específica – seja Software, Elétrica ou Produção.

No caso de Isadora, a turma começou unida, mas as preferências dos colegas se alteraram ao longo do curso. “No ciclo básico, eu tinha aula com todos, então não estava tão sozinha. Mas, conforme surgiram as matérias eletivas de Engenharia de Produção, fiquei só eu”, explica. “Engenharia de Software é a queridinha de todo mundo, então quase todos os meus amigos optaram por essa.”

Segundo ela, professores e instituição já esperavam que isso pudesse ocorrer. “Eles sabiam que eu era a única interessada em Produção. Não recebi apoio especial, até porque é algo previsto dentro do modelo do curso. Entretanto, novas turmas foram abertas e, agora, mais pessoas estão chegando. Em 2025, por exemplo, todas as vagas do Sisu foram preenchidas, e há quem escolha Produção. Então esse cenário vai mudar.”

ROTINA SOLITÁRIA, MAS RICA EM APRENDIZADO

Com o avançar dos semestres, Isadora se deparou com aulas completamente individuais. Ela e o professor, sem nenhum outro aluno presente. “É muito diferente de uma turma cheia, claro. Não dá para ter trabalhos em grupo ou debates de ideias. Por outro lado, tenho uma proximidade enorme com os professores. A aula rende muito, não há distração. Consigo tirar todas as minhas dúvidas, e o aprendizado acaba sendo bem aprofundado.”

Questionada se sente falta de companheiros para dividir tarefas, ela é direta: “Às vezes, sim. Se surge um trabalho em grupo, sou eu quem faz todas as etapas. Se preciso entrevistar pessoas fora da sala, tenho que correr atrás sozinha. Mas isso me estimula a ser mais independente e proativa. Então o saldo é positivo.”

Apesar de estudar sozinha em certas disciplinas, Isadora mantém o contato com os colegas de outras áreas. “Ainda tenho aulas básicas com todo mundo, nos intervalos nos encontramos, participamos de eventos. É um campus pequeno, mas está crescendo. Não me sinto solitária lá dentro. O único momento em que realmente fico sozinha é na sala das disciplinas específicas.”

 LAÇOS COM A ARTE E A COMUNICAÇÃO

O estudo de teatro por cinco anos ajuda a explicar a desenvoltura de Isadora em frente às câmeras. Ela menciona que sempre gostou de se expressar e conversar com o público, seja em apresentações artísticas ou em vídeos para a internet. “Isso reflete o quanto a arte me fez bem”, afirma. “Minha vontade de gravar vídeos não surgiu agora; eu sempre gostei de divulgar o que estava fazendo, seja no campus ou na cidade. Esse meu jeito comunicativo ganhou espaço na internet.”

A viralização de seu vídeo pegou a jovem de surpresa. “Eu não esperava que tanta gente fosse se interessar pela minha história. Eu só queria mostrar a rotina de ser a única aluna de Engenharia de Produção aqui. Fico feliz que tenha repercutido de forma tão positiva.”

REPERCUSSÃO E SURPRESA

A publicação em que Isadora mostra a sala de aula vazia, destacando ser a única matriculada, chegou a milhares de visualizações e comentários, rendendo até matérias em páginas de notícias na internet. “As reações foram diversas. Alguns acharam incrível a atenção individual do professor, outros questionaram se isso não prejudica o aprendizado.”

Ela fez questão de esclarecer a situação no próprio vídeo e nos comentários. “Expliquei que não estou sozinha em todas as matérias, apenas nas específicas de Produção. É algo temporário, porque outras turmas ainda estão chegando nesse estágio do curso. No meu dia a dia, encontro os colegas em outras disciplinas e atividades.”

APOIO E CRESCIMENTO DO CAMPUS

Isadora reforça que cursar Engenharia de Produção sozinha não é algo imposto, mas consequência da estrutura do bacharelado em dois ciclos, somada às preferências dos demais alunos. “Com mais divulgação, o curso está crescendo. Em 2024, tivemos mais matrículas. Em 2025, todas as vagas foram preenchidas e, certamente, não serei a única interessada em Produção. O campus ainda é muito recente e está se consolidando.”

O interesse crescente traz novas perspectivas para a UFLA em Paraíso. “O foco é tornar o campus mais conhecido. A UFLA tradicional, em Lavras, já tem grande reputação, mas o nosso campus aqui abriu em 2022. Então estamos trabalhando muito na divulgação para atrair futuros estudantes e mostrar a qualidade de ensino e estrutura que oferecemos.”

REFLEXÕES SOBRE A EXPERIÊNCIA

Em meio aos desafios, Isadora destaca a proximidade com os professores como o maior ganho. “Criamos uma relação quase de amizade, pois passamos muito tempo juntos. Isso facilita tirar dúvidas, pedir orientação, ir mais fundo nos estudos. Sinto que é um privilégio e sou grata por isso. Não me senti desmotivada em momento algum.”

Ela jamais cogitou trancar ou desistir do curso. “Reconheço o valor de uma universidade pública, especialmente em uma área onde existe tanta demanda por profissionais. Mesmo que eu tenha iniciado a jornada querendo Artes Cênicas, hoje vejo como Engenharia de Produção é interessante. Tudo na vida é aprendizado.”

DIÁLOGO COM OUTROS ESTUDANTES

Ao viralizar, Isadora passou a receber mensagens de jovens que vivenciaram algo semelhante. “Ninguém disse que também está totalmente sozinho, mas vários me escreveram contando que tinham três ou quatro alunos em cursos de Física ou Química em outras federais. Em alguns lugares, é normal turmas de exatas serem enxutas, porque nem todo mundo se sente à vontade com disciplinas mais complexas. E isso não é sinônimo de perda de qualidade.”

Ela também interagiu com quem se formou sozinho ou com poucos colegas. “Recebi mensagens de incentivo, de gente que passou por isso e me garantiu que, ao chegar ao mercado, somos tão bem preparados quanto quem tinha salas cheias.”

OLHANDO PARA O FUTURO

Questionada sobre que conselho daria a quem considera cursar algo pouco popular e corre o risco de ser “o único na sala”, Isadora sugere persistência. “Diria para não desistir. Ser o único não significa aprendizado menor. Às vezes, você até se destaca pelo acompanhamento mais próximo do professor e pelo senso de responsabilidade. Se for um curso que você gosta e acredita que vai te trazer realizações, vale a pena seguir firme.”

Além disso, ela destaca que, em breve, o cenário de sala vazia já será coisa do passado no campus de Paraíso. “Novas turmas de Engenharia de Produção surgirão. O que vivi vai acabar sendo uma curiosidade, mas fico feliz em ter sido uma espécie de pioneira. Pretendo me formar e mostrar para outros estudantes que essa possibilidade existe, que é real e também muito recompensadora.”

UMA VOZ QUE INSPIRA

No conjunto de tantas trajetórias universitárias, a de Isadora chama a atenção não somente pela sala vazia, mas pela forma cativante como fala do dia a dia acadêmico. “É gratificante ver alguém dar visibilidade a um campus que acabou de nascer. As pessoas às vezes não sabem que temos todo esse potencial aqui”, diz.

O que começou como uma mera coincidência de escolhas transformou-se em uma história capaz de alcançar milhares de pessoas nas redes sociais. Isadora segue confiante no caminho que escolheu e motivada a terminar a graduação com a mesma empolga-ção com que começou. “A educação é transformadora. Às vezes, a gente acha que precisa de muita gente por perto para aprender, mas, na prática, é a disposição de cada um que faz a diferença”, conclui.

Por Ralph Diniz – Jornal do Sudoeste – Foto: Divulgação

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